Uma Literal Viagem Pesada
- Ana Franskowiak
- 2 de jul. de 2020
- 3 min de leitura
Atualizado: 25 de mar. de 2021
Saudações Cósmicas! Querem montar uma banda comigo?
Alerta: a presente produção trata de temas muito caros à presente resenhista. Seu prazer ao discorrer sobre os mesmos pode se mostrar extremamente contagioso. Em caso de vontade incontrolável de escutar vocais furiosos, guitarras distorcidas, bateria nervosa e baixo pulsante, consulte sua playlist e ouça-a bem alto.
(Nem tanto caso já passe das dez, OK?)

Embora eu me considere uma pessoa diversa e eclética, talvez (ah, vá!) quem leia minhas publicações há algum tempo, não apenas aqui no Escurinho do Cinema, como também no meu perfil pessoal (por exemplo, fragmentos do romance no qual trabalho atualmente), tenha percebido que, quando se trata de música, dois gêneros preponderam: Rock, especialmente setentista e psicodélico, e Heavy Metal nas suas inúmeras vertentes.
Há algo neles de especial, de inexplicável, de mágico, parafraseando o divino Ronnie James Dio, que sopra nos ouvidos de quem os ouve e faz com que não nos contentemos em somente ouvir: todo e toda fã de Rock e/ou Metal já desejou ser membro de uma banda. E eu, baterista, atualmente desbandada, não sou exceção, embora hoje, após aproximadamente dez anos de Metal Extremo, me dedique em caráter exclusivo à escrita. É essa vivência prévia que faz com que Heavy Trip converse comigo tão intimamente, e tantas são as suas qualidades que o conhecimento da cena Metal, embora enriqueça a experiência, não se torna requisito obrigatório para plena apreciação. Ainda bem, porque ninguém aguenta mais a patrulha de fiscalização de camisetas indagando o nome das avós maternas e paternas de cada integrante que passou pela sua banda preferida…

Hevi Reissu, literalmente Viagem Pesada, é uma produção finlandesa de 2018, dirigida e escrita por Jukka Vidgren, Juuso Laatio, Aleksi Puranen e Jari Rantala, que narra a odisseia de Turo Moilanen, um cara comum, residindo numa pequena cidade comum, trabalhando em um emprego comum e fomentando um sonho mais do que comum, conforme aludido anteriormente: tornar conhecida a banda com a qual tem ensaiado há DOZE anos e tocar no maior festival de Metal da Noruega. Detalhe: a banda precisa de um nome, composições próprias, estilo próprio, e Turo, vocalista, precisa perder o medo de palco, que lhe causa reações psicossomáticas exacerbadas, para o azar de quem pegar lugar na primeira fila.
Que dizer dos demais membros da banda? Jynkky, baterista, é assertivo em seu desejo de tocar no maior festival da Noruega, proferindo uma frase que não somente será retomada mais adiante, como motivará um dos atos mais… eu diria inusitados, dessa viagem pesada, tornando-a um pouco mais complicada. Raras são as bandas que não trocam de membros. Felizmente, Turo é uma pessoa de fácil convívio, apesar dos preconceituosos que o provocam, do egocêntrico Jouni Tulkku (perfeita personificação antitética de um headbanger) e do pai de Miia, seu interesse romântico, sendo o posto rapidamente ocupado por Oula, que ele vem a conhecer no seu ambiente de trabalho: um sujeito peculiar, que só se acalma quando ouve essa que para muita gente é ainda considerada “música de gente louca”. Por que Jynkky, dito tão assertivo, saiu, e onde Turo trabalha? Assistam e descubram. Digo apenas que remete a uma das melhores músicas do Metallica, que por sua vez remete a…
Lotvonen, guitarrista, é a cara do Thrash dos anos oitenta, e o ápice de sua criatividade se dá não ao manejar a guitarra, e sim a máquina de cortar carne de rena enquanto trabalhava no porão de casa. Nada mais oportuno, uma vez que o porão de casa, além de sede do negócio familiar, também vinha servindo como estúdio por longos anos. Mas… como saber se a criação não passa de plágio inconsciente? Isso é trabalho para um especialista chamado…
Pasi? Não. Pasi, baixista, enciclopédia metálica de tom monocórdio e olhar peculiaríssimo, (de longe, meu preferido) está morto, segundo suas próprias palavras. Esse que se apresenta de spikes e corpse paint é Xytrax, responsável por cunhar o subgênero no qual a banda se enquadra. Banda, banda, ela ainda não ganhou nome? Impaled Rektum, a única representante (até então!) de Symphonic Post-Apocalyptic Reindeer-Grinding, está pronta para sua primeira e épica apresentação.

Deixe todo o glamour quem embarcar nessa viagem. Verossimilhança é a palavra de ordem ao peregrinar por cidades pequenas, estabelecimentos anos-luz do ideal e tentar fazer o máximo usando o mínimo disponível. É quase impossível não me exultar com o método econômico e algo imprudente que a Impaled Rektum encontra para tirar sua foto promocional, o mesmo valendo para a improvável passagem de um produtor musical pela pequena cidade finlandesa e a recepção dos nossos argonautas metálicos em território norueguês. Marcado por excelentes atuações e com direito a versos da Children of the Sea, Hevi Reissu é um filme que eu levo para a vida e exorto para que vocês o levem também.
Que suas viagens tragam tanta satisfação quanto o destino e do widzenia!
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