Midsommar - Crítica COM Spoilers
- D. C. Blackwell
- 13 de nov. de 2021
- 3 min de leitura
Quer morar no interior? Não vai querer mais!
Midsommar, de Ari Aster, chegou quebrando com vários padrões do horror psicológico ao subverter o cenário e o protagonista – ou Final Girl – típicos. Beleza e brutalidade andam de mãos dadas num tom que instiga uma espécie de paranoia no espectador, nos levando a vasculhar pistas e a nos agarrarmos na cadeira sob a perspectiva da próxima descoberta macabra no vilarejo sueco onde a trama se passa.
Começa pela protagonista completamente quebrada. Dani, além de solitária, é odiada pelos amigos do namorado, que quer terminar o relacionamento há mais de ano, mas não consegue criar coragem para tomar a iniciativa, manipulando-a para que ela pensasse que os problemas do relacionamento eram todos dela. Esse, porém, não é o único fardo que ela carrega: sua irmã comete suicídio e mata os pais aos primeiros dez minutos de filme, deixando o estômago do espectador gelado como uma entrada para o filme.

O suspense deve ter matado muitos ao longo da obra! A cada cena há um momento de tensão que se mistura com aquele clima alegre e festivo de cidade do interior, e o horror está implícito nos detalhes que o espectador vai buscar toda vez que há uma pista visual ou sonora. Algo está errado o tempo todo, e embora o espectador tenha certa noção do que está acontecendo, há também a expectativa de que algo pior está sempre espreitando, apenas aguardando um momento de calmaria ilusória para nos chocar com pleno potencial.
Uma das coisas mais interessantes do longa é a construção da subversão de Dani ao ponto final, em que ela se torna um membro da família. A cultura dos aldeões é extremamente empática, por mais louco que isso possa parecer, e isso se mostra logo no começo, quando ocorre a primeira parte do rito. Um dos idosos cai de mal jeito e precisa ser abatido, mas enquanto ele sofria, todos os aldeões gritavam e demonstravam sofrimento, como se dividindo aquelas sensações com ele.
Esse senso de pertencimento vai sendo reforçado cada vez mais conforme eles vão participando mais das festividades. Dani é literalmente absorvida pela cultura deles, como é mostrado perto do final, quando ela vê Christian fazendo sexo com uma aldeã. Ela chora e grita na cama, e as mulheres da aldeia choram e gritam com ela, como se todas fossem uma. Esse é um momento muito poderoso, porque é ali que Dani se sente parte de um coletivo desde que o filme começou. Pela primeira vez até então, alguém demonstrou realmente entender como ela se sentia, partilhou daquelas emoções, daquele momento de dor. Dali em diante, aquela aldeia se tornou o mais próximo que ela tinha de família.

Sobre a temática de Midsommar, é curioso ver como ela é antiga, de certa maneira. Pessoas como Lovecraft e Poe já escreveram muito sobre personagens que se veem presos a uma cultura estranha e assustadora para eles, o que mostra esse horror inerente do ser humano ao não-pertencimento. Em Midsommar, entretanto, esse conceito existe sem ser o conceito central. O verdadeiro horror de Midsommar, apesar de todos os assassinatos, é exatamente o oposto ao medo de não pertencer a outra cultura.
Aqui, o horror está em ser completamente tomado por ela, perder os próprios valores e ideais para um coletivo alienígena até a perda do “eu”. Dani foi influenciada paralelamente aos assassinatos até o final, quando ela já não é mais si mesma, e sim o coletivo da pequena aldeia sueca. A morte de Christian foi apenas um último gesto, a destruição de tudo o que Dani tinha – bom ou ruim, mas, na verdade, com certeza ruim – antes de chegar à aldeia.
Ari Aster continua me surpreendendo positivamente. Espero que ele continue criando obras espetaculares como esta!
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